Pessoas com TPAS não distinguem o certo do errado
O comportamento de pessoas com transtorno de personalidade antissocial (TPAS) se caracteriza, principalmente, pela incapacidade de distinção entre o certo e o errado e a falta de consideração pelos direitos, desejos e sentimentos dos outros. Também é conhecido como sociopatia e psicopatia, termos que se confundem, pois, em geral, em função dessa atitude peculiar, os especialistas se dividem – ora utilizando-os como sinônimos, ora diferenciando-os.
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – quarta edição (DSM-IV-TR2), publicado pela Associação Americana de Psiquiatria, a característica essencial do TPAS é um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos alheios, comportamento que pode começar na adolescência e evoluir na idade adulta.
Diagnóstico possível a partir da adolescência
Não é possível diagnosticar o TPAS na infância, uma vez que o transtorno se desenvolve no transcorrer da história de vida. Para que a doença seja identificada, o indivíduo precisa ter, no mínimo, 18 anos de idade e preencher três dos seguintes critérios:
(1) incapacidade de adequar-se às normas sociais com relação a comportamentos lícitos, indicada pela execução repetida de atos que constituem motivo de detenção;
(2) propensão para enganar, indicada por mentir repetidamente, usar nomes falsos ou ludibriar os outros para obter vantagens pessoais ou prazer;
(3) impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro;
(4) irritabilidade e agressividade, indicadas por repetidas lutas corporais ou agressões físicas;
(5) desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia;
(6) irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou de honrar obrigações financeiras;
(7) ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter ferido, maltratado ou roubado alguém” (APA, 2002, p. 660).
Pode-se dizer que, no comportamento de pessoas com TPAS, predomina a indiferença pelos sentimentos de terceiros, demonstrada por meio de uma atitude marcada pela crueldade, cinismo, mentira, desprezo por normas e obrigações, baixa tolerância à frustração, impulsividade e baixo limiar para a manifestação de atos violentos (OMS, 1993). Esse transtorno está associado também ao suicídio e à tendência de correr riscos.
Principais causas e fatores
Não se sabe ao certo quais são as causas desse transtorno. Estudos mostram que os fatores que mais contribuem são aqueles contextuais, como o baixo status socioeconômico, contato com ambientes agressivos, abusos na infância, alcoolismo ou TPAS na família. Estima-se que cerca de 6% da população tenha esse transtorno, sendo mais comum em homens do que em mulheres, e muito presente em contextos penitenciários e de reabilitação de jovens infratores.
Pessoas com condutas antissociais conseguem enganar, mentir e manipular os outros com muita facilidade. Esse comportamento dissimulado, juntamente com a falta de empatia, insensibilidade, agressividade, crueldade, falta de limites, relação familiar conturbada e abuso sexual e/ou bullying, podem ser indicativos desse transtorno.
Tratamento
Existem muitos obstáculos para o tratamento do TPAS. As próprias características desse transtorno interferem na adesão ao tratamento, tais como: desconfiança, fuga de intimidade, limitação na capacidade de formar aliança terapêutica de natureza colaborativa, desonestidade, dificuldade de trabalhar com metas e de pensar nas consequências de suas ações antes de agir (Bieling, Mccbe, & Antony, 2008).
Ainda há poucos estudos sistematizados sobre o tratamento de pacientes com TPAS que possam orientar a elaboração de programas mais efetivos. Em geral, pessoas com transtorno de personalidade antissocial só buscam ajuda quando apresentam sintomas como depressão e ansiedade, ou quando entram em conflito com a lei e são forçadas ao tratamento por um juiz.
Não há um exame específico que possa detectar o transtorno de personalidade antissocial, assim como não há para qualquer outro transtorno. Dessa forma, o diagnóstico é feito através de anamnese psiquiátrica associada à psicoterapia.
Caso de TPAS que chocou o Brasil
Em outubro de 2014, a notícia sobre o vigilante Tiago Henrique Gomes da Rocha, de 26 anos, que confessou à polícia ter matado 39 pessoas em Goiânia, chocou o Brasil. Em seus depoimentos, o rapaz listou suas vítimas a partir de uma relação organizada mentalmente, sem alterar o tom de voz ao nominá-las. Também não demonstrou sentimento de arrependimento, culpa ou compaixão, de acordo com o delegado Douglas Pedrosa. Os vizinhos, familiares, namorada e colegas do vigilante se declararam surpresos com a revelação dos crimes. Dois dias depois de ser preso, o vigilante tentou se matar, cortando os pulsos com o vidro de uma lâmpada quebrada.
Com a prisão, Tiago foi encaminhado à Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH) de Goiânia (GO), onde foi interrogado e confessou os crimes. Em sua casa foram encontrados vários objetos reconhecidos como tendo sido utilizados nos crimes, incluindo um revólver, que ele alegou ter roubado da empresa de segurança na qual trabalhava. Tiago foi avaliado pela junta médica oficial do Tribunal de Justiça de Goiás e recebeu o diagnóstico de psicopatia e transtorno de comportamento antissocial.
Fonte:
Fabiana Flávia Santos Vilaça, graduada em Psicologia pela PUC Minas, CRP 04/38911. Possui especialização em Gestão de Pessoas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Estudante do curso de aperfeiçoamento – Introdução a Clínica Lacaniana pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Psicóloga da Sercon Saúde e Segurança do Trabalho, Psicologia Organizacional.
Referências:
COSTA, Janelise Bergamaschi Paziani e VALERIO, Nelson Iguimar. Transtorno de personalidade anti-social e transtornos por uso de substâncias: caracterização, comorbidades e desafios ao tratamento. Temas psicol. [online]. 2008, vol.16, n.1, pp. 119-132. ISSN 1413-389X.
Caso Tiago Henrique Gomes da Costa – Portal G1/Tv Anhaguera (Fevereiro/2015). Acesso em agosto/2017.